Edição de 15-05-2008
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SECÇÃO: Opinião

Riqueza popular

A apresentação do livro “Cancioneiro Tradicional Português” fez-nos recuar no tempo, talvez uma dezena de anos, quando o professor José Ruivinho Brazão iniciou a sua peregrinação pelos lares da freguesia de Paderne, na descoberta de saberes guardados nas memórias de gente humilde que não lançara para o cesto do esquecimento o que ouvira transmitido pelos seus antepassados.

Não era uma tarefa fácil aquela que o estudioso da oralidade já tentara noutros locais, sem grandes resultados. Era forte a sua persistência ou obstinação, de mistura com um pouco de sorte, pois isto de procurar tesouros em campos não identificados nem sempre resulta.

Percorrendo alguns caminhos chegou às Almeijoafras, ou melhor a um pequeno lugar integrado neste sítio da freguesia de Paderne. Em casa da Almerinda Coelho foi encontrar esta e a irmã Feliciana que apesar de residir em Faro, há muitos anos vinha ao lugar onde nascera com muita frequência até porque integrava, tal como a Almerinda, o grupo coral que nascera na Sociedade Musical. Era aí o núcleo maior de um filão da mina que daria, nestes anos mais de metade do grande tesouro que Ruivinho Brazão, magnânimo e orgulhoso do seu feito, oferece aos que nas pequenas aldeias ou nas grandes cidades deste país saboreiam ao ler o que foi registado com saber e muita, mesmo muita, paciência.

Na primeira fase foram os provérbios, escritos ou gravados em mini-discos, largas centenas que chegariam a milhares. Saídos das duas irmãs informantes a que se juntaram outros espalhados pela freguesia. Depois de muitas horas de trabalho, na recolha, confrontando com outras formas de dizer, o primeiro livro foi editado. “Os Provérbios estão Vivos no Algarve” constituiu um achado pois trouxe à luz muita coisa escondida durante dezenas de anos e sabe-se lá como foi possível não ter-se perdido na voragem do tempo.

À medida que os provérbios iam surgindo, saiam também outras formas de tradição oral, como cantigas de janeiras, travalínguas, linquintinas, rezas e adivinhas, sempre cuidadosamente registadas pelo paramiólogo que dava graças a Deus por ter chegado a Paderne. As canções, quase todas elas já perdidas no tempo ou no esquecimento, surgiam com força e segurança nas vozes de Almerinda e da sua irmã Feliciana a que se juntara a companheira de muitos anos, Donzelica, também ela guardiã de muitas coisas bonitas.

Daí até à constituição de um grupo de música popular foi um salto. As Moças Nagragadas nasceram com a junção de mais dois elementos vocais, vindas de Boliqueime a que se juntaram uma acordeonista e outros instrumentistas. De êxito em êxito (pois o grupo era original) chegou a vez de entrar o Nelson Conceição, nessa altura aureolado com o título de campeão nacional de acordeão. Esta mais valia fez aumentar a qualidade do grupo que começou a actuar em palcos mais exigentes.

A recolha das dezenas de canções, quase todas elas vindas da memória da Almerinda, fizeram despoletar a ideia de constituir um livro onde as letras seriam acompanhadas pelas pautas musicais elaboradas pelo Nelson. O livro já foi lançado e o êxito é garantido mas a obra continua pois a Associação de Pesquisa e Estudo da Oralidade, criada para divulgar todas as recolhas efectuadas, tem mais livros preparados para editar.

É vulgar dizer-se que Portugal é um país pobre mas tem no seu povo uma riqueza incomensurável.

Por: Arménio Aleluia Martins

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