Arquivo: Edição de 20-03-2008
SECÇÃO: Opinião |
Felizmente há azulNuma passagem dos olhos pelos jornais diários, encontra-se sempre a referência ao tema segurança. Segurança na estrada, segurança na rua, segurança no emprego, segurança na saúde, segurança em casa, segurança dentro do carro. As notícias sobre a segurança misturam-se com as outras sobre o crime de sangue. Mas o crime tipo assaltos em série e com violência, descarga de drogas e sua entrada no circuito de consumo, roubo de esticão aos reformados ou com ameaça de arma branca aos jovens saídos das escolas para lhes sacar os telemóveis, nada disso é relevante porque os autores saem por ordem do juiz ainda o Polícia está a pôr as cruzinhas no Auto de ocorrência. Burocraticamente o magistrado consulta o Código e limita-se a cumprir assepticamente o que lá está estipulado. Uma assinatura devidamente carimbada, criminoso na rua e porta fechada que horário de funcionário é para cumprir, sobretudo na saída. E assim temos os mesmos sujeitos a serem presos mais que uma vez nas 24 horas, em assaltos sucessivos que vão repetir indefinidamente uma vez que o juiz os manda embora a aguardar julgamento. Torna-se-me difícil imaginar como as polícias ainda mantêm alguma motivação para o seu serviço, sobretudo quando sabem que se levarem um tiro ou uma facada o criminoso se escapa com uma pena quase simbólica, ou porque é toxicodependente, ou porque pertence a uma minoria não assimilada ou porque estava bêbado. Se o Polícia lhe enfiar com o cassetete no lombo para o segurar aqui d’el rei que bateram selvagemmente no pobre cidadão que apenas trazia una navalha na mão e bem apontada às tripas do agente. E o Policia fica suspenso, sem ordenado e sujeito a ir para a rua por ter querido continuar vivo. O que é um crime claro, que xui é para abater! Parece-me que os políticos falam demais da segurança e criticam em excesso as Polícias. Aliás os políticos falam demais de tudo, político não é cérebro pensante é máquina falante. De todos os partidos os arrotos de ciência social se ouvem em coro. Esquecem no entanto que as leis que estão em vigor e que permitiram esta escalada do crime foram votadas e aprovadas por eles próprios, políticos. Foram eles que amarraram as mãos aos polícias e abriram as portas ao crime através das leis que aprovaram. Agora procuram tirar o dito de cima das brasas a assobiam para o ar a ver se ninguém lhes pede responsabilidades. Será que as maiorias parlamentares que ao longo dos anos abandalharam as leis e permitiram que o crime prosperasse vão pedir estatuto de inimputáveis para se livrarem de responsabilidades perante os cidadãos? A par das leis vem a sua aplicação pelos órgãos competentes, os tribunais. Nunca consegui entender como um processo pode levar anos e anos nas secretárias de juízes até que prescreva e a justiça não seja feita nem sequer aflorada. E ainda menos entendo como esses juízes, (e são demasiados), não são sumariamente postos na rua por incompetência e antes pelo contrário formam um clã intocável que bloqueia governos e faz julgamentos em folhetins como a Casa Pia ou inquéritos gota a gota aos abates dos sobreiros do Alentejo e aos negócios camarários escandalosos. São segredos que ao Povo a que pertenço não chegam as respostas. Ao Povo apenas chega a indicação de que tem que tratar a Justiça por Meritíssimos e Vossas Excelências e não se manifestar sobre as sentenças incríveis que proferem nem sobre o tempo de parição das mesmas. Ficamos a sabe-las pela imprensa, mas bico calado. Dar uma opinião franca poderia ser considerado ofensa à classe dos Meritíssimos… e isso sim, dava mesmo prisão! Por isso o cumprimento é do modo adequado: atento, venerador e obrigado. Principalmente obrigado e com vénia. E assim a cor do meu país vai perdendo o brilho e tomando tons de desespero. Tons que não pertencem ao arco-íris e que apenas aparecem nas noites de trovoada e tempestade. Compensa-me ver no meu quintal as minhas ervilhas de cheiro que começam a florir e no meio da massa verde da folhagem surgem as pinceladas de azul das pequenas flores firmemente agarradas nas suas guias. Felizmente há azul, talvez nem tudo esteja perdido. Por: António Belchior |